Segundo a Antroposofia, cada elemento, substância e ser vivo sobre a face da Terra fazem parte de um conjunto harmônico que respira como um verdadeiro cosmo vivo. Esse cosmo possui um aspecto sensível, visível e mensurável com o qual nos relacionamos através de nossos sentidos e que compreendemos racionalmente através da nossa ciência acadêmica, mas também possui um conjunto de forças não visíveis, o seu aspecto imaterial ou supra-sensível.
Para a Ciência Espiritual de Rudolf Steiner, esse campo supra-sensível é tão real e passível de ser estudado, quanto o mundo material. O ser humano ocupa uma posição muito peculiar dentro dessa cosmovisão. Ele é considerado uma imagem condensada desse mundo ao seu redor. Um microcosmo em permanente interação com o macrocosmo material e espiritual.
Os três princípios constituintes do homem ou Trimembração
Quando contemplamos o corpo humano, podemos perceber três partes bem distintas: cabeça, tronco e membros. Por trás dessa aparente simplicidade esconde-se, no entanto, um dos grandes segredos da arte antroposófica de curar.
Para um médico antroposófico, o ser humano é um organismo trimembrado. Aprofundando-se nessa direção, ao observarmos a cabeça, vemos que nela predominam os processos neurossensoriais. Se observarmos o cérebro, vemos uma estrutura de baixíssima vitalidade e alta especialização. Através da cabeça, a maioria dos estímulos sensoriais penetra no cérebro por meio dos pares cranianos. Uma outra característica da cabeça é que seus ossos têm formas planas e arredondadas e situam-se na periferia, de maneira a proteger o cérebro.
No pólo oposto encontram-se o abdômen e os membros, com predomínio de intensa atividade metabólica, onde os processos de regeneração celular são muito ativos e há um “ir para o mundo” tanto através das mãos e dos pés, quanto através dos resíduos que eliminamos. Os ossos, nesse pólo, são longos e retilíneos e encontram-se protegidos por musculatura, dando-lhes sustentação.
Entre essas duas regiões de características tão distintas, encontra-se o tórax, que, na Medicina Antroposófica, abriga o equilíbrio entre as polaridades descritas, sendo a sede do sistema rítmico, que promove a inter-relação saudável entre o pólo neurossensorial e o pólo metabólico. Aí encontram-se órgãos rítmicos: coração e pulmões, protegidos por um arcabouço, as costelas, que também se movimenta. E assim, resumidamente, temos um homem trimembrado em seus sistemas neurossensorial, rítmico e metabólico. Cada um deles permeia todo o organismo humano, mas concentram-se principalmente em uma região do corpo.
No caso do sistema neurossensorial, ele está mais concentrado na região da cabeça, mas sabemos que todo o corpo humano possui nervos.
O sistema rítmico concentra-se principalmente na região do coração e pulmões, isto é, no tórax, mas todo o corpo humano possui artérias que pulsam ritmicamente e a respiração também acontece em cada célula de nosso corpo.
O sistema metabólico concentra seus órgãos principalmente no abdome e o movimento ativo nos membros, mas cada parte do nosso corpo possui seu metabolismo e movimento próprios.
Na vida psíquica, essa trimembração pode ser identificada nas três atuações básicas: pensar, sentir e agir.
Os quatro elementos constituintes do ser humano ou Quadrimembração
“O homem é o que ele é através do corpo físico, do corpo etérico ou vital, do corpo astral (alma) e do Eu (espírito). Ele deve ser visto como homem sadio a partir desses membros; ele deve ser percebido, quando doente, no equilíbrio perturbado deles; para sua saúde devem ser encontrados medicamentos que restabeleçam o equilíbrio perturbado”. – Elementos fundamentais para uma ampliação da arte de curar – Rudolf Steiner e Ita Wegman
Uma das maneiras de apresentar o homem à luz da Antroposofia, é relacioná-lo com a natureza ao seu redor. Nessa abordagem, o homem é visto como um ser que compartilha semelhanças com os reinos mineral, vegetal e animal, mas que também se distingue deles pela presença da sua autoconsciência. Podemos dizer que o homem guarda em si todos esses reinos, sendo portador de quatro estruturas essenciais, de quatro elementos constituintes, também chamados de “corpos” no jargão médico-antroposófico.
Corpo físico: é a estrutura sólida, material, palpável e mensurável, sujeita às leis da física e da química. É o corpo que compartilhamos com os minerais. É uma estrutura totalmente inerte e morta quando não permeada pelo segundo elemento (corpo etérico).
Corpo Etérico ou Vital: são as forças responsáveis por todo o princípio da vida, seja nos vegetais, animais ou seres humanos. O corpo vital nos dá a possibilidade de desenvolvermos vida vegetativa: crescimento, regeneração e reprodução.
Corpo Astral (corpo anímico ou alma): são as forças da consciência, presentes nos reinos animal e humano, e que formam o fundamento para uma vida sensitiva. Tem um papel de “organizador” dos processos vitais e, de maneira didática, podemos dizer que ele manifesta-se como sistema nervoso e vida psíquica.
Organização do Eu (espírito): é o elemento característico do ser humano, que o distingue dos demais reinos e seres da natureza. É o responsável pela atuação saudável dos demais corpos e o aparecimento do andar ereto, da fala e do pensar. É a nossa individualidade, nossa entidade espiritual. Relaciona-se com os processos de calor no âmbito do organismo.
Uma analogia pode ser feita com os quatro elementos da medicina hipocrática e também da alquimia: terra (corpo físico), água (corpo etérico), ar (corpo astral) e fogo (Eu).
As etapas do desenvolvimento humano ou biografia humana
Uma das grandes contribuições da Antroposofia para a Medicina e a Psicologia é o aprofundamento do estudo das leis biográficas. Se observarmos o ser humano em seu processo de desenvolvimento, veremos que este se dá em ciclos de sete anos, marcados por acontecimentos significativos no campo biológico ou psicológico.
Do nascimento aos sete anos de idade, vemos profundas transformações relacionadas com o crescimento e desenvolvimento neuropsicomotor. O bebê transforma-se em uma criança com pensar lógico, com sentimentos, vontade própria e muita agilidade. A troca dos dentes e o início da alfabetização, em torno dos sete anos, marcam essa mudança de ciclo.
Aos quatorze anos, a maioria dos jovens atingiu a puberdade, marcando um amadurecimento biológico, e aos 21 anos geralmente buscam a sua independência da família, já tendo alcançado a maioridade jurídica. E assim, a alma humana vai se transformando junto com o seu corpo físico-biológico, à medida que o Eu, a individualidade, vai se aprofundando em seu caminho pela Terra.
De maneira mais resumida, vemos três grandes marcos biográficos: do nascimento aos 21 anos; dos 21 aos 42 anos; dos 42 aos 63 anos/final da vida. Cada um desses ciclos pode ser dividido em três setênios com características muito definidas.
Mas, num olhar abrangente sobre o ciclo de vida humana, vemos um início de vida com muita vitalidade física e pouca consciência; depois um período com maior desenvolvimento emocional e o “apropriar- se do mundo”, seguido geralmente por uma fase de maturidade, sabedoria e desenvolvimento de consciência social, mas com baixa vitalidade.
No fim da vida há um “desprender-se do mundo”. Segundo a Antroposofia, o Eu humano tem uma trajetória encarnatória, descendendo dos mundos espirituais de onde se origina, do nascimento à metade da vida (por volta dos 42 anos), quando esse processo chega ao fim. Logo após começa a sua trajetória de volta aos mundos espirituais, caracterizando uma trajetória excarnatória, um processo ascendente. Entre esses acontecimentos, o Eu humano desenvolve uma história individual, única: a sua biografia. Compreender o processo de saúde e de doença significa também compreender o momento biográfico, suas crises e seus frutos.
Texto: Biblioteca Antroposófica